domingo, 26 de março de 2017

Textos de Fátima Zampieri nas Oficinas de Criação Literária.

Exercício sobre o trecho inicial de Conto de Escola, de Machado de Assis.
Florianópolis, 6 de abril de 2017
Querido Neto,

Como você sabe gosto de relembrar o passado. Hoje acordei lembrando da minha escola primária. Era na Rua Bocaiuva, um colégio cor de rosa, dois andares, construção meio clássica, se a minha lembrança não estiver me traindo. A casa das freirinhas do lado, na frente o pátio e atrás o parque com balanço e gangorra. Sempre nos aguardava, Maria Helena, ruiva, com os cabelos loiros e longos, sorriso cativante e tranquilo. O colégio ficava perto de um açougue, do seu Gentil, homem calmo, conversador e atencioso, que me ajudava a atravessar a rua, na qual raramente carros transitavam. Também era próximo do Bar do Katcipis, onde os homens mais velhos jogavam dominó, tomavam umas cervejas e jogavam fora conversas e amenidades. Lembrei-me da pracinha com as flores, árvores e os bancos de praça, onde eles debatiam as reportagens, eu acho, dos jornais.
Naquele dia, uma segunda feira, do mês de maio, deixe-me levar por pensamentos, naquela praça, a ver onde iria brincar a manhã. Hesitava entre o pomar de minha vizinha e o Parque Dona Tilinha, que, segundo minhas lembranças, já tinha as árvores de hoje, um chafariz amarelo no centro, ruas calçadas por paralelepípedos, casas açorianas no seu entorno e a Capela do Espírito Santo, palco de grandes quermesses que participei na minha adolescência. Pomar ou parque? Tal era o problema. De repente ‒ disse comigo ‒ que o melhor era ir para a escola. E guiei para a escola. Aqui vai a razão.
Na semana anterior, tinha feito uma arte, tinha voltado sozinha para casa pela primeira vez, e ainda pedido ajuda para um homem na rua para localizar minha residência. Quando contei a meus pais, preocupados com o acontecido, conversaram comigo sobre os perigos de falar com pessoas estranhas e andar sozinha pela cidade. Eles me assustaram um pouco. Nunca tinha parado para pensar nisto. Não via mal em ninguém. Meu pai era um comerciante, que estava se formando em direito, muito atencioso e bem preocupado com o trabalho e com a família. Minha mãe sempre foi uma mulher de personalidade forte, decidida e envolvida junto com o meu pai na formação dos filhos. Os ensinamentos deles influenciaram e continuam influenciando positivamente na minha vida.
(A continuar)


Florianópolis, 30 de março de 1992.
Querida Evelyn,

Saudade das nossas festas e conversas no bar do básico, nossos banhos de piscina na Sílvia, dos passeios de bicicleta à beira mar e em Coqueiros. Ultimamente só temos conversado por fone. Não é a mesma coisa. A gente não consegue olhar nos olhos e sentir a pessoa.
Por que este saudosismo agora, nos meus 32 anos?
Tudo começou com a Mariana.
A mãozinha dela se colocou na frente da tela do computador e um pedido seguiu. “Mãe, a professora pediu para procurar palavrinhas com a letra “E” e também figuras.”
Inicialmente não dei muita atenção e continuei entretida na redação do artigo que teria que entregar nos próximos dois dias.
Insistentemente, ela puxou minha blusa e falou: “Tem esta revista. Eu achei um elefante. A professora mostrou o desenho na sala de aula, mas tem que achar mais.”
Estava decidida com aquela revista na mão, cabelos caídos no ombro, um olhar persistente e voz firme.
Resignada, deixei tudo o que tinha que fazer e sentei com ela para fazer a sua primeira grande tarefa escolar. Logo desfilaram várias palavras, com a letra definida, em diversas cores, em itálico, em letra de forma, pequenas e grandes: elefante, entrada, escola, emoções, equilibrista, escada, encantamento, eterno, estrela, estórias, esperança, espantalho, escova, espada, emprego e erro. Ao lado, a Juli, rasgava algumas revistas, imitando a irmã.
Ao mesmo tempo que procurávamos as palavras e as respectivas figuras, ela me indagava sobre o significado de algumas palavras. Entre elas, três se destacaram e me fizeram voar no tempo: equilibrista, emoções e esperança
Equilibrista. Mostrei a ela um homem caminhando sobre uma corda e falei convicta e sem pestanejar “Uma pessoa que caminha em um fio nas alturas, sem cair. Balançam mas não cai”. Corri para a estante e peguei o livrinho infantil, chamado “equilibrista”, e mostrei a figura. Lembrei da Elis Regina com a música equilibrista, e dos momentos da ditatura e de recessão, que fizeram alguns ativistas políticos caminharem longos anos em cordas bambas, colocando em risco suas vidas.
Pensei com os meus botões. Equilibrista, sim, são as mulheres, caminhando no fio da vida. Quando são mães e têm uma profissão, passam a assumir diferentes papéis: ser mulher, ser filha, ser mãe, ser esposa, dona de casa, amiga e ser profissional. Perfeição? Hum! É quase impossível ser 100% em cada um destes papéis. É necessário priorizar aquilo que é mais importante. Quando os filhos nascem são dependentes; é preciso fazer escolhas. Afinal de contas, é responsabilidade dos pais, cuidar dos filhos. Não é uma tarefa fácil. Inicialmente, logo após o nascimento da criança, a mulher fica desorientada, tem a impressão que perde o espaço e o tempo. Vivencia um turbilhão de sensações e emoções: cansaço, alegria, tristeza, medo, realização e frustração. Apresenta mudanças corporais, emocionais, hormonais e sociais. O ritmo e estilo de vida pessoal, conjugal e familiar se modificam. A mulher, por vezes, provisoriamente, necessita deixar alguns objetivos profissionais, diminuir o ritmo de trabalho, deixar de cuidar de si e priorizar a atenção ao filho. É bem verdade que hoje esta tarefa tem sido dividida entre o casal e as coisas ficaram bem mais tranquilas e equilibradas.
É super importante a participação do pai. Os dois precisam se preparar para vivenciar maternidade e a paternidade, participando de grupos educativos. Lembro que é fundamental aproveitar com qualidade o tempo que estamos com nossos filhos, para curti-los, pois crescem muito rápido. É uma adaptação e tanto e, desta proximidade depende a aprendizagem mútua: nossa, como pais, e deles, como filhos. Nesta convivência, vamos aprendendo com nossos filhos e colocando em prática a tarefa instigante de educar. É uma experiência gratificante, mas exigente.
Emoções, a segunda palavra que encontramos. “Sentimentos, minha filha ‒ tentei explicar com as minhas palavras. A tristeza, e em especial, a alegria, a felicidade o Amor. Mostrei um coração pequeno e vermelho que enfeitava a cabeceira da cama.
Esperança, talvez esta tenha sido a palavra mais difícil para elucidar e ilustrar. “Acreditar que os nossos sonhos se realizem, minha filha; confiança que tudo vai dar certo.” Procurei no google figuras que representassem tal palavra e apareceram as crianças. Nossa esperança de um mundo melhor. “Criança esperança”. Acho que entendeu. Pegou seu caderno e foi colar as letrinhas junto com as figuras na mesinha perto do computador.
Então, lembrei da gente, Evelyn, de nossa última conversa pelo telefone, do teu desejo de engravidar e do tratamento que estás fazendo. Com a experiência que tenho na obstetrícia, gostaria de te sugerir para procurares relaxar um pouco junto com o teu companheiro, passear sem muito compromisso, sem se preocupar com o calendário e com os dias propícios para concretizar uma gravidez. Deixar a vida levar e a natureza agir. Não perder a esperança. Tenho percebido que ficar meio neurótica pela gravidez, não tem ajudado muito neste processo.
Por outro lado, a opção de adotar um filho, como tu comentaste; é uma possibilidade interessante. Na maternidade, atuei junto ao Juizado na questão da adoção e percebi que as crianças adotadas, que vinham me visitar, apresentavam as mesmas características e modos de agir de seus pais adotivos. Adquiriram, muitas destas características, interagindo com os pais.
As mulheres que adotavam filhos passavam os mesmos dilemas e alterações de papéis enfrentados pelas mães biológicas. Muitas apresentavam alterações emocionais e físicas, inclusive. No caso da adoção, as responsabilidades ainda parecem ser maiores, porque o casal faz a escolha daquela criança e assume um compromisso de fazê-la feliz.
Ser mãe, por escolha ou biologicamente, é uma emoção e uma grande responsabilidade que não se traduzem em palavras.
Perdida em meus pensamentos, sou sobressaltada com uma voz suave que vinha de longe.
Era a Mariana, precisava escovar (“olha o “e”, mãe ‒ disse) os dentes dela e os da Juli, para depois dormirem. Coloquei-as na cama, beijei as duas, e quando ia desligar o abajur, com aqueles sorrisos marotos, pediram: “Mãe, a estorinha”.
Sentei entre as duas camas, pequei o livro “O equilibrista” e comecei a contar de uma forma que entendessem, mostrando as figuras: Era uma vez... Em meio a tantos “Es”, quando terminei a última frase, percebi que já ressonavam.
Reli novamente a última página. “Acho que esta vida de equilibrista é muito perigosa. ” ‒ falava um. “Acho que é chata e estressante” ‒ dizia outro. “Vale muito a pena” ‒ outros falavam. O equilibrista deu sorrisinho e comentou: “O interessante é que cada um acha o que quer”. The end.
É Evelyn, tu és quem sabe o que queres. Espero que tomes a melhor decisão. Por ora, só posso te fazer um convite. Vir aqui na praia para podemos rir e nos divertimos juntas.
Até,
Beijos

Marisa

Florianópolis, 23 de março de 2017.
Aos novos amigos, conto um pouco de minha vida...

O som do “Desaranha” entrou tímido e suavemente pela janela do meu quarto para lembrar que hoje é dia de Florianópolis, a ilha cantada, em verso e prosa, e estudada por Franklin Cascaes; um pequeno pedacinho de terra, “não” tão perdido no mar, a ilha da magia, com tradições açorianas e encantamento.
Lembro que hoje é quinta-feira, dia da oficina de criação literária, dia em que teria o compromisso de, usando o Relógio de Memórias, redigir cronologicamente fatos que são parte importante do meu viver.
Confesso que me dei conta de que não é fácil falar de mim. Um dos motivos: rever toda uma trajetória e refletir sobre ela, e outro, a dificuldade de redigir situações que não fossem técnicas, já que nos últimos vinte anos tenho escrito artigos técnicos ligados à área obstétrica e neonatal, com embasamento teórico e metodológico de autores da área. Sempre traduzi nos textos minha filosofia de pensamento, o cuidado humanizado no nascimento e os valores éticos que tento seguir. Contudo, de certa forma, esta demanda me fez deixar de lado a poesia e a ternura que tentei rabiscar na minha adolescência. Em alguns momentos, me fez sentir engessada e pressionada pela necessidade e apelo à produção científica, exigida pela academia e instituições de fomento.
Tudo começou com o meu nascimento. Nasci em 1961, em Florianópolis, na Rua Carlos Correia. Tenho orgulho de ser manezinha. Amo esta ilha, com seu mar azul e praias brancas. Adoro a conversa dos pescadores e “contação” de casos pela manhã e no final de tarde, ao lado das canoas, nem sempre cheias de peixe. Sou a filha mais velha. Nasci prematura e lutei muito para viver. Minha hipotermia foi superada pelo amor de meus pais e o uso de criatividade, usando tijolos para aquecer minha pequena cama.
Em 1968, comecei a estudar no Curso Elementar Menino Jesus, meu coleginho. Era a menor da turma e sempre tinha o colo da diretora e das professoras. Todos se conheciam. Lembro-me de minhas professoras Elizabeth, Dilva, Leonilda e Maria José e de muitas amigas. Algumas fazem parte do meu convívio até hoje. Minhas mestras me ensinaram a ler, a fazer contas, a trabalhar em grupos, a pesquisar, redigir, a me encantar com a vida, respeitar o outro, tão difícil hoje em dia, e a me maravilhar com as coisas simples: pular corda; brincar de elástico; correr atrás das freiras e puxar o seu hábito para descobrir, se tinham cabelos; cantar o hino; brincar de “queimei” e de esconder; pintar andar de balanço e na gangorra, jogar bola e roubar bolacha da cozinha das irmãzinhas. Lembro-me dos piqueniques, passeios, gincanas, festas juninas para angariar recursos e fico feliz por ter contribuído para a construção física e filosófica daquela instituição de ensino.
Já o primeiro “AMOR”! Foram tantas pessoas importantes que passaram pela minha vida. Pergunto-me. Será que tive um grande Amor? Na adolescência conheci um menino em um baile de Carnaval e quando me abraçou me senti protegida e querida. Na nossa inocência, nos demos a mão. Foi meu primeiro namorado, mesmo que um tanto platônico.
Em 1979, entrei na Universidade no Curso de Enfermagem. Inicialmente houve dúvidas em relação ao curso porque não tinha muita aderência à doença. Realize-me na prevenção de doenças e, especialmente, na promoção da saúde, e posso dizer que sempre amei o que fiz. Tive muita sorte na vida.
O tempo na Universidade foi um grande aprendizado. Novas realidades e pessoas. Abertura de novos horizontes. Um passo importante para minha maturidade. Era um tempo de ditadura, de luta estudantil, e mesmo com medo da repressão, participava do centro acadêmico, das discussões em frente da reitoria, “novembrada”, das festas e forros, boates na Engenharia e Dizzy.  Aproveitei todas as oportunidades para o lazer e para o estudo. Fui bolsista e monitora de várias disciplinas. Lembro ainda das lutas para manter a ponta do coral como espaço para o lazer da comunidade, com as apresentações do Grupo Engenho e Expresso Rural sob a lua cheia. Maravilha!
Em 1980 ou 1981, não sei precisamente, porque me esforço para não lembrar, perdi meu irmão de forma boba nas águas da Lagoa da Conceição, uma pessoa alegre que congregava todos os amigos, os escoteiros e bandeirantes, ao som do violão e da gaita, uma pessoa do bem que acredito olha por mim nos momentos de dificuldade. Tempos muito tristes para minha família, sobretudo para meus pais.
Em 1981, conheci meu marido em um projeto Rondon, em Santarém, a primeira vez que andei de avião e que sai mais de uma semana de casa. A oportunidade de andar no Tapajós e no Rio Negro, vacinar e cuidar das comunidades ribeirinhas que surgiam em seus barcos em um piscar de olhos. Também de trabalhar nos centros de saúde.  O primeiro namoro firme e duradouro.
Meu primeiro emprego, contradizendo todos os meus desejos profissionais, foi na psiquiatria, em 1983, no Hospital Colônia Santa. Aprendi muito com aqueles rotulados de “loucos”, muitos deles pessoas com grau de sensibilidade e conhecimento que vão além do que a sociedade aceita, e que por ironia precisam ser isolados nos grandes manicômios. Foi uma escola de vida e um dos momentos que contribuiu, sobremaneira, para melhorar o relacionamento com as pessoas e aceitar o diferente.
Em 1985, casei e mudei de cidade. Fui morar em Joinville. Trabalhei em uma maternidade e tive a primeira experiência na gerência de uma instituição de saúde. Foram grandes mudanças: de cidade, estado civil, casa e serviço. Senti muita saudade do cheiro e da brisa do mar, do jeito manezinho de falar, da minha família e dos meus amigos. Procurei para morar o único lugar em Joinville que recebe a brisa do Mar. Fiz grandes amigos.
Construí minha história de vida junto com meu marido. Já faz 34 anos que nos conhecemos e desta união nasceram as pessoas que mais amo em minha vida: minhas filhas. Gabriela nasceu de cesariana e Juliana de parto normal. Foram os momentos mais felizes de minha vida. Amamentei as duas bastante tempo, a Juliana parou de mamar quase com dois anos. Minha casa vivia cheia de meninas e meninos.  Entre erros e acertos para educá-las, sempre estive por perto, junto com seus amigos, lutando para felicidade e realização delas como pessoas. Hoje são mulheres e lutam para conquistar seu espaço e serem valorizadas no mercado de trabalho. Tem seus amores e iniciam um novo ciclo de vida, mas pasmem, às vezes, as vejo ainda como aquelas menininhas que precisavam de cuidado e proteção.
Em 1989, votei pela primeira vez para presidente, depois das “diretas já”, no Color. Acreditei que o país poderia crescer, ter liberdade de expressão, ser autossuficiente e ser governado de forma democrática e ética, mas para minha tristeza, tivemos que ir para a rua e brigar pelo “impeachment”.
O que vejo hoje é um país atolado na corrupção, paralisado pela incompetência de seus governantes no uso de recursos, falta de decoro dos seus representantes, mídia que atende aos interesses financeiros e do mercado. Desemprego, insegurança, violência, desrespeito. Contudo, ainda tenho esperanças no povo brasileiro que ainda não tem noção da força que tem para mudar este país, para torná-lo uma potência, para manter os valores éticos, para preservar o ambiente e a vida humana. Acredito muito nestas gerações que estão surgindo, que precisam motivar esta virada. Continuo achando que o Brasil ainda é o melhor país para viver.
Uma das mudanças importantes também foi o retorno à Florianópolis, em 1994. O cheiro do mar, o boi de mamão, as festas do Espírito Santo e da Laranja. Santo Antônio. Ribeirão da Ilha. A volta à minha terra foi concomitante a outra grande transformação que teve um impacto bem grande em minha vida: foi o ingresso na Universidade Federal de Santa Catarina, como docente, neste mesmo ano.
No dia de minha aprovação, andei pelos corredores desta universidade, meio perdida, lembrando-me do tempo que ingressei na graduação nessa Universidade; com um peso grande sobre os ombros, pois a partir daquele momento passaria a ter a responsabilidade pela formação de pessoas que cuidam de outras pessoas. Ensinar a prestar uma atenção humanizada, qualificada e compromissada, colocando-me no lugar do outro e, ao mesmo tempo, aprender com estas pessoas, com os alunos e profissionais. Não dormi várias noites.  Não posso me queixar sempre trabalhei com o que gosto e nesta instituição não foi diferente. As mulheres e a promoção da sua saúde: foi neste trilho que pautei a minha vida acadêmica e me realizei profissionalmente. Foram muitas conquistas, muito além do que poderia imaginar.
Foi na universidade que, nos idos de 1996 ou 1997, tive o contato com a tecnologia. Oh dificuldade! Sou da era do telefone manual, da máquina de datilografia, do televisor preto e branco e, iniciar um mestrado e, depois, um Doutorado, que exigia a informática, necessitou um grande aprendizado e, até, uma mudança de paradigma. Depois do computador, o progresso tecnológico evoluiu tão rapidamente e invadiu nossas vidas que hoje a sua falta resultaria em caos nas comunicações e relações sociais.  Admito que tenho algumas resistências com algumas tecnologias, sobretudo com o smartphone e não o vejo como acessório essencial em minha vida como acontece com esta nova geração que já nasce mexendo em tabletes, tirando “selvies” e com o controle da televisão digital na mão. Utilizo apenas quando necessário, mas sou cobrada por esta opção diariamente. Sinto falta dos diálogos pessoalmente e por telefone. Atropelada pelo whatsapp, o face book, e os e-mails que nos facilitam a vida em alguns momentos, mas que nos enredam, nos aprisionam e nos fazem perder tempo, quando viajamos sem rumo pelas redes sociais.
Hoje, passada toda aquela trajetória, na primeira semana de aposentadoria, olho para atrás e me pergunto: 
‒ Será que cumpri com a minha missão?
Surge um sentimento de perda, mesmo que a aposentadoria tenha sido uma opção pessoal. Dá uma sensação de liberdade, de dever cumprido, de realização e, ao mesmo tempo, de envelhecimento e de finitude. A certeza que tenho é que sempre trabalhei com amor, sempre procurei ser ética e dar o meu “melhor” nesta Instituição, representando-a nos diversos contextos, de acordo com os seus princípios e filosofia.
Hoje sentimentos se misturam. Mexer em tudo o que construí, limpar minha sala, esvaziar minha mesa de trabalho, transferir meus projetos a outros docentes para que tenham continuidade, deixar de fazer parte desta família e deixar para traz mais de vinte anos de serviço. Não, não é muito fácil. Por outro lado, ter oportunidade de realizar outros projetos é algo instigante. Cuidar de mim, viajar, retomar antigas amizades, oportunizar encontros familiares, outras oportunidades de atuação profissional.
Invadindo esta reflexão, neste momento, um novo som entra no meu quarto, o Rancho de Amor a Ilha, finalizando a festa em comemoração aos 344 anos de Florianópolis. Fogos de todas as cores são desenhados no céu e refletem na água escura da Baía Norte. Um novo ano finalizou, um novo ano na história desta ilha e da minha história e outro está por vir...
Uma etapa na minha vida está gradativamente finalizando, não de todo, já que continuarei voluntariamente a desenvolver algumas práticas direcionadas à Comunidade e à pesquisa na UFSC. Como os fogos, novos desenhos surgirão em minha vida, novas pessoas e novos projetos, uma renovação e oportunidade para recomeçar.
Um dos projetos é contar histórias para as crianças carentes da periferia de Florianópolis e escrever estórias para elas. É um desafio grande. Muitas leituras têm que ser feitas.  Certamente a troca e o compartilhamento das histórias dos participantes destas oficinas serão os propulsores para trilhar esta nova trajetória. Conto com todos nesta caminhada. 

Citação

Grupo vocal Dasaranha. Dia Lindo. Disponível em
https://www.vagalume.com.br/dazaranha/dia-lindo.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário